GAÚCHO

          No extremo sul das Américas, existe uma região chamada Pampa, esse espaço geográfico se estende desde o rio Salado, ao sul de Buenos Aires, delimitando-se a noroeste pelas regiões que ficam ao norte do rio Negro (Uruguai), até o rio Jacuí (RS). Imensas planícies verdejantes, caracterizadas por uma vegetação composta por gramíneas e plantas rasteiras, situadas nas cercanias do estuário do Rio da Prata, formado por esse rio e seus afluentes, cujas águas se convertem no Oceano Atlântico. Antes da ocupação primeva do espaço cisplatino e transplatino por portugueses e espanhóis, habitavam esse território uma diversidade de povos autóctones. Esses nativos exerceram grande influência no  modo de viver próprio dessa região e de seu agente social mais característico, ou seja, o gaúcho.
       O espaço platino começou a ser explorado em 1531, pelos portugueses, com a expedição de Martim Afonso de Souza e Pero Lopes de Souza, os quais chegaram às terras do sul do Rio da Prata, demarcando-as para a Coroa Portuguesa. Os espanhóis procuraram ocupar o mesmo território fundando em 1536, o núcleo habitacional de Buenos Aires, destruído logo depois por nativos e novamente fundado em 1580.
Em 1626, o Padre Roque González de Santa Cruz atravessou o Rio Uruguai e fundou o primeiro núcleo de povoamento estável na região sulina do Brasil, a Redução de São Nicolau de Piratini, iniciando um projeto de catequese dos nativos pela Companhia de Jesus, fundando mais tarde outros aldeamentos chamados de Reduções, que formariam criatórios de gado vacum, ovino e eqüino e prática de agricultura. O gado vacum havia sido introduzido nessa região desde 1628, tanto que em 1633 registram-se em pequeno número nos povoados missioneiros. Só em 1634 o padre Cristóbal de Mendoza introduziu o gado vacum em grande escala.
            Os jesuítas desenvolveram junto aos nativos habilidades agrícolas e técnicas de criação e pastoreio. Esses aborígines reduzidos nas Missões Jesuíticas espanholas foram cobiçados como mão-de-obra pelos paulistas, que organizados em Bandeiras os apresavam, por ocasião da ocupação pelos holandeses das zonas africanas que forneciam mão-de-obra escrava.
            Os religiosos, ante essas constantes investidas, retiraram-se com seus nativos para a margem esquerda do Rio Uruguai, deixando o gado bovino nesse território. Desenvolvido à lei da natureza, esse gado reproduziu-se sem a interferência humana, formando imensos rebanhos selvagens de gado chimarrão ou orelhano, sendo que esses rebanhos atrairiam toda a sorte de aventureiros para a região.
O gado eqüino já estava no Pampa desde o século XVI, se desenvolvera livremente nas planuras do sul desde a expedição de Mendoza em 1535. Os nativos haviam aprendido o manejo desses animais selvagens. Mais tarde o cavalo foi reintroduzido pelo porto de Buenos Aires e pelo de Rio Grande, da mesma forma que o gado vacum povoaria os campos platinos. Não somente os rebanhos bovinos constituíam motivo de atração.
           De acordo com o Tratado de Tordesilhas, firmado em 1494 entre Portugal e Castela, a região do Rio da Prata era área hispânica. No ano de 1680, Portugal decidiu apossar-se da riba setentrional do Rio da Prata. Diante de Buenos Aires, iniciaram a construção de uma fortaleza: a Colônia de Sacramento. Essa cidadela foi cobiçada pelas duas coroas ibéricas, por dois outros objetivos: o controle integral da margem setentrional do rio da Prata e o domínio sobre as terras das campanhas da Banda Oriental.
       Ao mesmo tempo, os povoados missioneiros se desenvolviam na margem esquerda do Rio Uruguai; os espanhóis, na tentativa de bloquear o acesso dos lusitanos tanto pelo mar como pela terra, fundaram várias localidades, no século XVIII, como Montevidéu, Maldonado e San Carlos junto ao rio da Prata.
Para suprir as necessidades da colonização e na exploração das minas, foi necessária a utilização de mão de obra escrava negra, contrabandeada pelo porto de Buenos Aires; escravos negros, trazidos do Brasil ou diretamente das colônias africanas por comerciantes portugueses, começou a fluir para o cerro potosino.Uma expedição militar portuguesa comandada pelo brigadeiro José da Silva Paes foi enviada em 1737, para garantir aos lusitanos a posse de terras no Sul, espaço territorial disputado entre Portugal e Espanha. Sendo um ponto geográfico estratégico para a fixação do domínio lusitano, a Barra do Rio Grande de São Pedro constituía-se no local ideal para que lá se instalasse um reduto militar com acesso marítimo ao interior. Para efetivar a ocupação, ao fundar o presídio do Rio Grande.
          Para pôr fim às disputas luso-espanholas na América foi assinado o Tratado de Madri, com o qual o Brasil ganhou praticamente seus contornos definitivos, a Espanha cedeu o território das Missões Orientais do Uruguai a Portugal. Dessa forma, Portugal entregou-lhe a Colônia de Sacramento. Tal fato não ocorreu em harmonia, os nativos comandados pelos jesuítas rebelaram-se, recorrendo às armas para permanecer no território. As Missões Jesuíticas foram aniquiladas na Guerra Guaranítica, forçando o povo guarani a uma retirada; com a invasão luso-brasileira nos Sete Povos, em 1801, os guaranis se dispersaram pelo Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina, trabalhado como peões, tropeiros e artesãos.
O último tratado negociado entre as duas nações ibéricas foi de Santo Idelfonso, em 1777, pelo qual a Colônia de Sacramento e as Missões Orientais voltaram à soberania espanhola.
Em 1821, o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, oficializou a anexação da Banda Oriental ao Brasil com o nome de Província Cisplatina.
        Estes cenários, geográfico, político e humano, proporcionaram o surgimento do homem mestiço no Pampa rio-platense. Embora esse espaço, desde a sua ocupação pelas coroas ibéricas, tenha sido uma zona conflituosa, sempre cobiçada e disputada, onde aconteciam contatos beligerantes, também havia condições para outras relações. A interação social entre os habitantes propiciou o surgimento de um tipo social, fruto da aculturação e caldeamento entre as etnias. Este tipo social ocuparia a paisagem sulina do continente americano. Tal sujeito chamado gaúcho, por questão de sobrevivência, teve que se submeter às normas impostas pelas mudanças que iam paulatinamente alterando o cenário econômico, político e social das províncias sulistas no decorrer dos séculos.
         O gaúcho, na sua trajetória histórica de apreensão dos costumes, compartilhou-os com seus contemporâneos homônimos do espaço regional platino. Esse agente social desenvolveu-se motivado pela paisagem do Pampa e pelos signos culturais das etnias que o constituíram, habitando a região hoje pertencente a três países (Uruguai, Argentina e Sul do Brasil).Seus valores transfiguraram-se com a passagem inexorável do tempo. O que se entende por gaúcho no espaço regional do Prata contemporâneo, como gentílico do Rio Grande do Sul ou como 'el gaucho' nos países vizinhos de língua espanhola, distanciou-se daquele gaúcho histórico primordial.

FRIDA KAHLO



Anos depois desse dia, ela pensaria que deveria ter ouvido sua voz interior quando acordou.
O dia letivo terminara e ela esperava o ônibus, um autocarro, uma novidade para o ano de 1925, era uma tarde primaveril do dia 17 de setembro. Ajeitou a calça que usara para disfarçar sua perna mais fina e o pé meio torto, embora essa seqüela da doença infantil não mais a incomodasse. Acostumara-se aos apelidos da infância. Já tivera na vida sua dose de tragédia na vida quando foi acometida pela poliomelite. Estava alegre, o namorado juntara-se a ela nessa espera.
Tinha passado o dia estudando na Escola Nacional Preparatória da Universidade do México, preparando-se para o curso de medicina, o que muito orgulho lhe trazia, pois era uma das 35 meninas entre cerca de dois mil rapazes. Queria ser médica.
Em outra direção um trem fazia um trajeto oposto ao ônibus que ela ansiava.
Seu pai um fotógrafo judeu-alemão e sua mãe uma mestiça mexicana a esperavam em Coyoacán, um povoado da periferia da capital, queria contar ao pai que a estimulava a freqüentar aulas de pinturas, o aprendizado daquele dia. Frida sempre fora curiosa, inteligente, independente e persistente. Praticante de vários esportes gostava de andar de bicicleta e de nadar.
Quando o ônibus chegou entraram e ela sentou-se perto de uma senhora que levava um vidro grande cheio de um pó dourado.
O bonde que vinha em direção contrária ganhava velocidade. E se aproximava perigosamente.
Andaram algumas quadras e ônibus e trem colidiram, era um bonde elétrico. Frida foi jogada para fora, fora do veiculo e do próprio destino, num mundo de dores, cores, gritos, amputações e mortos. Destroços voaram alto, ouvia-se o ranger de dentes, corpo dilacerados. Comoção total.
Um momento surreal: ela ficou coberta de sangue, tinha uma barra de ferro atravessada no abdômen que saía pela vagina. Ela tinha 18 anos e estava partida ao meio, fraturada, rasgada, fragmentada física e emocionalmente. Ao sol o pó dourado que a tudo cobrira reluzia misturado ao sangue. Ela estava brilhante. Dourada.
Muito tempo passou, exilada da convivência de amigos, presa a quatro paredes e a uma cama hospitalar,ela começou a pintar num cavalete adaptado, pintaria sua própria biografia, pintaria suas telas deitada, muitas com um espelho na frente. Ela diria que pintava a própria realidade, que não era surrealista e que não pintava sonhos.Provavelmente sua maior seqüela foi o fato de não poder ter filhos, mesmo assim insistiu tendo vários abortos.
Seu país vivia o renascimento após uma revolução sangrenta, ela teria que vivenciar sua própria revolução e ressurgimento, enfrentar cerca de trinta e cinco cirurgias e uma vida amorosa conflitada, precisaria forjar na dor um devir diferente do imaginado.
Encontrar uma motivação. Filiada ao Partido Comunista, conheceu seu marido, um famoso muralista, teve uma vida conjugal tumultuada por casos extraconjugais com homens e mulheres, traições,desgostos e separações. Conheceu Leon Trotsky. Admirava Lênin, Marx e Engels. Suas obras, dizem os críticos, beira a ingenuidade, adotou temas do folclore mexicano, afirmando a identidade nacional. Suas telas refletem sua luta constante contra a dor. Tinha consciência de pertencimento à cultura mexicana ancestral e exibia isso também em sua forma de vestir, usava roupas indígenas e penteava os cabelos com torçais de lã de cores brilhantes,usava anéis, colares e brincos de ouro, jade, pérolas e conchas, muitos traziam símbolos e hieróglifos da cultura asteca. Era autêntica.
Aos 47 anos foi encontrada morta. Meses anos precisara amputar uma perna. Há suspeitas de suicídio. Suas cinzas foram colocadas numa urna pré- colombiana e repousam na Casa Azul transformada em museu. Sua ultima anotação no diário foi:
“Espero alegre a saída e espero nunca voltar."
Frida Kahlo criou um vinculo único e indissociável entre sua vida, seu amor, suas perdas e suas telas, usou pincéis da dolorosa realidade para retratar sua vida com sangue, intimidades e tintas.

TEINIAGUÁ

A lenda da "Salamanca do Jarau" está ancorada em três pilares: a atração exercida pela mulher, metamorfoseada em um animal (salamandra), pela abnegação do homem simples do campo, representando os valores imprescindíveis ao gaúcho e pela capacidade da lenda de ultrapassar o âmbito regional, atingindo o território da universalidade.
Quando a Espanha árabe ruiu ,os mouros fugiram, alguns estabeleceram-se na região sul do Brasil. Junto veio uma jovem princesa, transfigurada magicamente em uma velhinha, para não ser reconhecida e aprisionada.
Logo de chegada, encontraram o Anhangá-pitã, o demônio dos nativos. Contaram-lhe a história e o diabo resolveu ajudá-los. A linda princesa foi metamorfoseada numa salamandra com a cabeça de pedra brilhante ou "Teiniaguá" e viveria em uma lagoa no cerro do Jarau (município de Quaraí,região sudoeste do Rio Grande do Sul).
Atrás da Igreja da aldeia, morava um sacristão de nome Blau que foi até a lagoa, refrescar-se; a água fervia, e no meio dela surgiu Teiniaguá. Ele sabia que ela era uma linda princesa moura virgem e quem a conquistasse seria muito feliz.
Rapidamente colocou-a em uma guampa levando-a para seus aposentos. À noite, Teiniaguá tinha voltado a ser princesa e pedindo-lhe um pouco de vinho, apaixonado, roubou o vinho do padre, na sacristia. Os padres começaram a desconfiar do sumiço da bebida e invadiram seu quarto. A princesa assustada transformou-se em Teiniagá fugindo para as barrancas do rio Uruguai e o sacristão, acabou preso, condenado a morte no garrote vil.
No dia da execução, Teiniaguá com o coração apertado, utilizou-se de magia; procurou seu amado, abrindo sulcos na terra, até chegar à igreja, interrompendo a execução.
Salvos os dois ficaram escondidos em uma caverna muito funda e comprida no Cerro do Jarau e só seriam libertos desse encantamento, quando surgisse alguém que vencendo todas as provas de coragem e, depois de realizar um desejo que lhe seria concedido, desistiria dele.
Duzentos anos se passaram sem que ninguém tenha quebrasse o encanto. Certo dia campeando o gado, Blau chega à furna de Jarau. Conhecia a lenda, pois sua avó charrua já tinha lhe contado quando era criança. Saudou o antigo sacristão das Missões e submeteu-se a todas as provas de coragem. Logo foi levado à presença da salamandra encantada, que lhe concedeu um desejo. Porém, Blau nada desejara.
Quando ele montava seu cavalo para ir embora, o sacristão alcançou-lhe uma moeda de ouro como lembrança de sua estada. Para não fazer desfeita, aceitou-a. Durante muitos dias, Blau nem lembrou mais do ocorrido, porém lhe apareceu um bom negócio, um amigo queria desistir de criar gado e dizia-se interessado em vendê-los, puxou a guaiaca e lembrou-se da moeda. Muitos bois não poderia comprar, mas ao sacar a moeda da guaiaca, de lá retirou tantas moedas quantas fora preciso para comprar a boiada inteira. O amigo espalhou a notícia. E todos ficaram estarrecidos, pois Blau era um gaúcho pobre. Muito solitário, pois todos o evitavam, temendo um possível pacto seu com o diabo, devolveu a moeda. Nesse momento, o encantamento se quebrou e das furnas saíram os dois condenados, transformados em belos jovens. O final feliz foi seu casamento e a prole que trouxe descendência indígeno-ibérica ao Rio Grande do Sul.
Uma vez que os mouros introduziram a prática da magia negra na Espanha,sendo a cidade de Salamanca o mais importante reduto dessa prática( esse culto era praticado em cavernas e subterrâneos escuros e ocultos), aqui nessa região encontrou terreno fértil e apropiado para a mítica salamandra transformada em lenda povoar o imaginário popular e a pampa sul-platina.

VLAD, O EMPALADOR






Historicamente ele é conhecido por ter sido um cavaleiro cristão do século 15, um príncipe, um guerreiro de Cristo que lutou contra o expansionismo islâmico na Europa, considerado um herói ainda nos dias atuais em sua terra natal, a Romênia, e na República da Moldávia. Governante feroz, defensor de seus conterrâneos, respeitado por súditos e inimigos, lembrado pela suas temíveis formas de tortura e pelas atrocidades que costumava provocar em seus prisioneiros. Principalmente o empalamento, que consistia na inserção de uma estaca no ânus, vagina, ou umbigo até a morte do torturado. Outras maneiras de execução e tortura eram pregos fincados na cabeça e braços dos condenados, decepamento de membros, orelhas e narizes cortados, órgãos sexuais mutilados, principalmente os das mulheres, morte na fogueira, despedaçamento por cavalos, etc.
Suas estratégias de guerra também eram terríveis, usava a tática da “terra arrasada” e fazia incursões noturnas nos acampamentos inimigos matando sorrateiramente o maior número possível de homens sem deixar rastros. Sabia como despertar um dos mais obscuros sentimentos humanos: o medo.
Vlad III Tepes, o Empalador. Príncipe da Valáquia, antigo principado entre o rio Danúbio e os Alpes Transilvânicos, ele reinou sobre suas terras em 1448, de 1456 a 1462, e em 1476, ano de sua morte. Seu sobrenome romeno, Drácula (Draculea e/ou Drakulya), significa "filho do dragão", e refere-se a seu pai, Vlad Dracul, que recebeu este apelido de seus súditos após ter se juntado à Ordem do Dragão, uma ordem religiosa. Dracul, que vem do latim draco ("dragão"), significa "diabo" no romeno atual.
O reinado de Tepes foi cruel e sangrento. Os relatos dos feitos e das atrocidades cometidas por Tepes eram tão impressionantes que um poema épico sobre ele foi publicado pela máquina de impressão de Gutenberg.
Era uma época conturbada, pois os feudos romenos pertencentes aos três principados da Valáquia, Moldávia e Transilvânia no século 16, passaram para o domínio do Império Turco-Otomano, sendo também disputados pelos vizinhos do Império Austro-Húngaro, aos quais Vlad apoiava. Quando criança, como parte de um acordo entre seu pai e os turcos, Vlad ficou sete anos sob o domínio do sultão, sendo prisioneiro dele, numa demonstração de submissão paterna.
No ano de 1447 a Hungria invadiu a Valáquia e seu pai e irmão foram mortos, ele assumiu o trono por pouco tempo porque foi deposto, ficou escondido e em 1456 retornou e assumiu seu posto por seis anos. Nesse período o império turco otomano avançava sobre a Europa, ungidos pela fé eles ampliavam as fronteiras; em terra seus avanços foram orientados pela disciplina e inovação do exército otomano, no mar sua marinha bloqueou as principais rotas comerciais, controlando as rotas de maior tráfego entre a Europa e a Ásia.
Numa nova invasão Vlad III refugiou-se sozinho na Transilvânia, pois para não ser aprisionada pelos invasores, sua esposa se jogara de uma torre do castelo. Aprisionado naquele principado durante doze anos, durante os quais se reaproximou do rei, casando-se com uma de suas irmãs. Em 1476 conseguiu recuperar o reino que lhe havia sido usurpado, mas, diante de nova ofensiva não conseguiu sobreviver. A forma de sua morte não é suficientemente comprovada, algumas fontes dizem que ele morreu em combate durante o confronto que se seguiu, outras que foi assassinado por seus próprios soldados porque se encontrava disfarçado com roupas inimigas. Seu corpo foi decapitado pelos turcos e sua cabeça enviada à Constantinopla, onde o Sultão a manteve em exposição em uma estaca provando que o temido empalador tivera um fim.
Ele foi enterrado em Snagov, uma ilha-monastério localizada perto de Bucareste. Quando arqueólogos escavaram o túmulo nos anos 30, encontraram apenas ossos de animais.
Relatos alemães e turcos da época enfatizam sua crueldade; os turcos o odiavam e os alemães tinham questões econômicas e políticas com ele, os relatos romenos são orais e o consagram como um herói. O certo é que ele defendeu seu minúsculo principado de um esmagador império, enquanto pôde. Seu papel na história da humanidade não se perdeu no crepúsculo do tempo. Imortalizou-se de várias formas.
Essa história não é sobre o mito, mas sim sobre a figura real, em carne e osso: Vlad, o Empalador.

Os "BRUMMER"




Brasil e Argentina tiveram uma disputa ferenha pela influência no Uruguai (antiga província brasileira, a Cisplatina) e pela hegemonia na região do Rio da Prata, travada durante o período imperial brasileiro nos anos de 1851 e 1852.
Quando o conflito se iniciou ao sul do continente americano, chegava ao fim do outro lado do mundo a Primeira Guerra do Schleswig que deixou um grande contingente de soldados disponíveis. Essa guerra era um desacordo entre Dinamarca, que apoiara Napoleão e que deveria devolver ducados para a Prússia e Áustria, mas não o fez gerando essa guerra. No seu término o exército brasileiro contratou e embarcou para defender o Brasil doze companhias de mercenários germânicos, cerca de mil e oitocentos soldados de várias regiões que haviam lutado nesse conflito bélico, chamados de Brummer; Eles chegaram ao Rio de Janeiro em junho de 1851. Uma das razões dessa preferência é que já havia imigração de colonos germânicos para o Brasil, pois o Imperador D. Pedro I era casado com a arquiduquesa austríaca D. Leopoldina, filha do Imperador, ou Kaiser da Aústria ,Francisco II.
Nesse contexto lutar era uma profissão como outra qualquer.Engajar-se sob outra bandeira era contingência da necessidade de mão-de-obra em outros exércitos.Os oficiais e soldados vieram como profissionais das armas, contratados formalmente, era um trabalho.
Nessa ocasião o Império brasileiro também comprou farto material bélico: cerca de 200 fuzis Dreyse com agulha de carregar pela culatra, era o que havia de melhor e mais evoluído no velho mundo, cerca de 12 canhões prussianos,2 equipagens de pontes e 40 carretas austríacas de 4 rodas, para tração cavalar ou muar.Os canhões e equipagens de pontes se mostraram impróprios para as operações de guerra das campanhas do Rio Grande do Sul e do Uruguai, pois havia carência absoluta de estradas e pontes .
Brummer significa resmungador, murmurador. Os Brummer. Os ranzinzas. Provavelmente reclamavam do soldo e das condições de vida e falavam um dialeto estranho aos demais imigrantes alemães. Mas também dava - se o nome a antiga moeda feita em cobre com a qual eles eram pagos. Eram moedas pesadas que zuniam no balcão dos armazéns.
Os oficiais Brummer tinham grandes rivalidades entre si, que durante a viagem foram sendo reforçadas até a frente de batalha no sul do Brasil. Muitos soldados recrutados eram novatos, e longe da terra natal se entregavam a brigas e arruaças. Eles também deveriam obedecer ao sistema disciplinar prussiano, o que não funcionava para uma “legião estrangeira”, pois se tratava de uma espécie de código de honra.
Muitos desses homens eram atiradores experientes e equipados com os modernos fuzis, foram estrategicamente distribuídos entre as unidades de Infantaria, com a proposta de caçar os artilheiros de Rosas (Ditador Argentino) no seu raio de alcance, essa surpreendente tática forçava facilmente o rompimento das posições de artilharia inimiga, e a conseqüente penetração da cavalaria brasileira.
Porém poucos foram enviados para linha de frente para defender as fronteiras meridionais, pois os oficiais do exército brasileiro não confiavam muito neles. Até porque ao chegarem ao território conflagrado, a guerra estava terminada. Muitos morreram de frio, desnutrição ou doenças recorrentes da carência alimentar, outros tantos desertaram. Os Brummer tinham um contrato de quatro anos, e só no final desse tempo receberiam o dinheiro e passagem. A maioria preferiu ficar aqui, e o prazo do contrato foi cumprido vagando pela provincia do Rio Grande. Engajados ao exército permaneceram somente 450 que receberam terras posteriormente nos núcleos de colonização alemã. Trabalharam como comerciantes, agrimensores, agricultores, professores ou diretores de colônias. Entre eles uns seguiram carreira política, tinham alto nível intelectual. Parte desses homens se integraram ao Regimento Mallet em Santa Maria, a “bateria alemã”.
Alguns Brummer que se destacaram foram: Carlos Von Koseritz, na defesa dos direitos políticos dos imigrantes, o Barão Von Kahlden, Wilhelm Von Ter Brüggen e Frederico Hänsel que foram membros da Assembléia Provincial do Rio Grande do Sul; Herrmann Rudolf Wendroth, pintor que registrou em aquarelas a vida da província sulista, Franz Lothar de la Rue, primeiro diretor da colônia de Teutônia; Carl Otto Brinckmann, jornalista em Santa Maria; Carlos Jansen, jornalista em Porto Alegre.
Recrutados para defender pátria alheia, porém sua luta seria outra, sua guerra seria sobreviver em terra estranha, sobreviver às adversidades do destino.
Soldados sem guerra, longe da pátria mãe, da família, sem medalhas, sem honras de herói, enfrentando conflitos que não eram seus, sem bandeira, fugidos da fome, da miséria, da revolução industrial, da falta de unidade, da terra exaurida, do êxodo rural e cheios de desejos. Os resmungões: silenciosas e caladas memórias em livros de história.

ANITA G.




Que estranhas as malhas da renda das vidas das mulheres. Intrincados meandros que se entrelaçam. Uma vez estive na casa de Anita Garibaldi em Laguna (SC), muitos anos depois minha filha esteve em seu túmulo na Itália.(foto).O túmulo onde Anita foi sepultada pela sétima vez. Morreu provavelmente vitima da malária, embora a tuberculose, lesão pulmonar, congestão intestinal e tifo das montanhas foram outras causas mortis atribuídas.
Garibaldi em suas memórias escreveu: "Ao depor minha mulher no leito, me pareceu descobrir em seu rosto a expressão da morte. Tomei-lhe o pulso... já não batia. Eu tinha diante de mim o cadáver da mãe de meus filhos, que eu tanto amava."
Grávida de seis meses morreu na terra de seu esposo, longe de onde nascera e seu corpo teve seis sepultamentos antes do definitivo.
No dia fatal, no derradeiro instante de sua vida, os compatriotas italianos, os liberais uruguaios, os farrapos brasileiros e os republicanos do novo e do velho mundo não puderam pranteá-la, ela e Garibaldi estavam em fuga e em luta pela unificação da Itália. Ele foi obrigado a partir deixando seu corpo entregue a dois homens para que a enterrassem clandestinamente, pois corria risco de morte, eles o fizeram dantescamente por duplo medo: o de contágio e o das patrulhas noturnas. Era o dia 4 de agosto de 1849.
O cadáver foi colocado sobre um carro de duas rodas que encalhou na areia, eles completaram o percurso arrastando a morta, por meio de uma corda amarrada ao pescoço. Dias depois uma criança achou o cadáver semi encoberto. Tinha um ferimento feio no pescoço que confundiu o médico legista na necropsia, soube-se que se tratava do cadáver da esposa de Giuseppe Garibaldi, o que atraiu as autoridades militares austríacas. No dia 11 de agosto foram realizadas as exéquias, ela foi sepultada em cova simples, com uma cruz de madeira, no cemitério local atrás da igreja de Madriole, na região de Ravenna.
Dez anos depois, liderados por Francesco Manetti, alguns garibaldinos remanescentes seqüestraram os restos mortais de Anita, sepultando-a em segredo. Tinham o receio de que a sepultura fosse violada pelos adversários da unidade italiana, temiam seu desaparecimento. Descoberto o seqüestro, o padre Francesco Burzatti recuperou os restos mortais e enterrou-a no interior da Igreja, perto do altar.
Em 22 de setembro de 1859, ao voltar de seu longo exílio, Giuseppe Garibaldi, acompanhado pelos filhos Menotti, Riciotti e Teresita, foi a Mandriolle, desenterrou os restos mortais, organizou um cortejo fúnebre para o sepultamento em Nizza, junto a sua mãe. No caminho passou por diversas cidades, parando para homenagens e exaltações, nas cidades de Ravena, Bolonha, Livorno, Gênova e Nizza. Garibaldi pagou a promessa feita à memória de Anita no dia de seu falecimento e motivou as populações por onde passou a retomarem e prosseguirem a luta pela unidade italiana.
A cidade de Nizza (atual Nice) foi transferida ao domínio da França, em pagamento de empréstimo de guerra, durante o segundo período da campanha da unificação italiana. Em 1931, por solicitação do Governo de Mussolini, a França consentiu no traslado dos restos mortais para Roma. Como as obras da Praça Anita Garibaldi ainda não estavam prontas ela foi sepultada provisoriamente em Gênova.
Em 2 de junho de 1932,(exatamente 48 anos antes do nascimento de minha filha)o Governo italiano patrocinou e promoveu um gigantesco traslado, transformado o evento em um dos maiores atos cívicos da história da Jovem Itália. Seu túmulo encontra-se no monte Gianícolo,em Roma, lá descansam os restos mortais de Ana Maria de Jesus Ribeiro, Anita Garibaldi, a heroína dos dois mundos.
Aninha desde pequena via o mar como parte de sua vida, gostava de caminhar na areia fina, sentir a maresia; o oceano despertava emoções diferentes nos seus sentidos de menina e olhava para o horizonte intuitivamente, sabia que em algum momento do seu futuro daquela linha distante viria algo que transformaria seu destino raso de ribeirinha. Sabia montar, de personalidade livre, gostava de cavalgar pelo litoral catarinense. Casada a contragosto precocemente com um homem mais velho, prático, rude que não entendia direito seus sonhos etéreos numa terra em conflito, preocupado com sua sapataria e pescarias que cedo a abandonou para lutar junto às tropas imperiais. Ela tinha uma pele morena com longos cabelos negros, e olhos escuros, ágil, esbelta e indômita, despertava a inveja das mulheres e o desejo masculino, alheia aos padrões morais da época costumava banhar-se no mar, gostava de viver ao ar livre, curiosa e esperta para sua idade.
O estado ao sul estava em guerra com o Império, descontentes com o sistema político vigente. Laguna seria o porto que um homem predestinado a ser considerando herói no velho e novo continente, tomaria em 1837, durante a Guerra dos Farrapos, a serviço da República Rio-Grandense.
Na comemoração pela vitoria ela avistou, em meio aos líderes farrapos, a figura de um homem vestido com roupas diferentes. Vestia botas compridas com calças pretas, parcialmente cobertas por um poncho cinza claro Não era um homem muito alto com um cabelo longo e loiro, com olhos claros, sentiu por ele um sentimento que jamais havia tido a oportunidade de experimentar. Garibaldi tinha, então 32 anos de idade.
Garibaldi que morava no seu navio costumava direcionar sua luneta para a terra e numa dessas ocasiões Aninha entrou no seu foco de visão, logo a tomou para si como Anita - e desde então permaneceram juntos. Acompanhava-o em todos os combates, entusiasmada com os ideais democráticos e liberais dele, aprendera a lutar
com espadas e usar armas de fogo, mulher destemida se transformaria numa companheira para todos os momentos, no sul do Brasil, no Uruguai e na Itália.
Da união de Giuseppe e Anita nasceram quatro filhos: seu primogênito Menotti, o único que nasceu no Brasil – Rio Grande do Sul; e nos anos seguintes Rosita, Teresita e Riccioti, que nasceram na capital uruguaia. Rosita morreu quando tinha apenas dois anos e meio, vítima de um ataque de difteria.
Mulheres. Anitas, Marias ou Micheles.Desimporta o século.Tecem todas elas às portas de seus sonhos tramas invisíveis. Como renda de bilro. Atemporais. Tecem junto a outras mulheres da mesma rua, a trama dos destinos; minha rua passa por outras cidades, atravessa países, ignora oceanos, não há fronteiras. Tecemos todas nós o mesmo fio, matéria viva,dos nossos anseios, dos nossos segredos, das nossas desistências, da nossa sina.

MALINCHE





No número 57 da Rua Higuera, em St. Coyoacán, distrito da Cidade do México existe uma imponente casa de pedra, está lá há mais de 500 anos, mas não há sinal, placa, nada que indique quem foram seus moradores, tampouco é um museu; nenhum mexicano passa em frente, e quando algum turista desavisado para admirando-a é logo discretamente guiado para outro caminho. Todos sabem o nome da única mulher que ali morou, mas seu nome não é pronunciado.
Ixkakuk, Malina Tenepal, Malintzin, Malinalli, Dona Marina.Malinche. Ela é conhecida por muitos nomes em vários dialetos, mas com o passar do tempo, seu nome tornou-se associado com a traição
Quando ela nasceu, um oceano e muitos séculos de diferenças culturais a separavam de seu destino.
Os pais eram caciques em uma cidade chamada Paynala, nasceu na etnia nahua.Logo, a mãe viúva casou-se com outro cacique e teve um filho com o novo marido. Para que o bebê tivesse direito à herança, o casal resolveu dar a filha mais velha para os nativos de Xicalango. Assim, ela aprendeu tanto o idioma maia quanto o náuatle, a língua asteca. Essa habilidade com idiomas a tornaria imprescindível nas conquistas espanholas no novo mundo. Alta e forte para sua idade, aprendera ser mais assertiva do que comumente se espera para as mulheres jovens. Ela freqüentou a melhor escola de Tenochtitlán, um privilégio concedido a algumas meninas, e foi educada pela avó, Ciuacoatl. Além de aprender as artes domésticas, ela continuou a leitura e a escrita de pictogramas e estudou oratória e retórica, assim como a medicina das ervas.
Ela, como seus contemporâneos, esperavam a reencarnação do deus Quetzalcoatl, que voltaria para acabar com os sacrifícios humanos praticados pelo imperador asteca Montezuma,como pregava a profecia. Ele chegou na pele de um estrangeiro muito alto, com cabelos e barba vermelhos e olhos claros, chegou pelo mar em embarcações que eles jamais imaginaram, portavam armas de fogo e espadas de material nunca vistos e montavam cavalos, animais desconhecidos e traziam doenças...
Hernán Cortéz antes de desembarcar no México esteve em Cuba com seus soldados. A colonização espanhola em terras americanas teve início nas ilhas do Caribe e das Bahamas. Acreditavam que deveria existir ouro em grande quantidade em todo o continente americano. Assim ele partiu de Cuba e desembarcou no litoral do que hoje é o México, em 1519 com 11 navios e mais de 508 soldados, gripe e varíola. Logo encontrou duas pessoas que lhe seriam muito úteis: Jerônimo Aguilar, um náufrago espanhol,que havia sido prisioneiro dos maias na península de Yucatán e conhecia a língua maia, um dos idiomas falados no Império Asteca.
E Malinche, uma das vinte jovens prisioneiras que foram oferecidas como presente pelo nativos a ele na chegada a Tabasco, uma das várias províncias do Império Asteca. Oferenda de boas vindas ao deus recém chegado
Cortéz teria uma vantagem importante em relação aos astecas, contaria com a ajuda de guias e desses intérpretes, por meio dos quais, obteve muitas informações a respeito da situação do Império Asteca.
Batizada como Marina, Doña Marina, rapidamente aprendeu o castelhano e se tornou guia conselheira, tradutora, intérprete e amante de Cortéz, pois ele era casado, chegando a ter um filho dele, reconhecido pelo espanhol e batizado como Martín Cortéz. Os astecas se referiam como Malinche, ao próprio Cortéz. Malinche se traduz como "O capitão de Marina", sendo a própria Marina chamada "La Malinche", a mulher do capitão.
Hábil para aprender idiomas e para negociações entre culturas diversas ajudou os espanhóis na tentativa de estabelecer relações amigáveis com o império Asteca e a conquistar aliados entre povos indígenas tributados por Montezuma.
Após a conquista do império asteca, Cortéz, por ser casado na Espanha, arranjou para Malinche um casamento com um castelhano, Don Juan Xamarillo. O filho de Malinche seria o primeiro "mexicano", o primeiro mestiço, amálgama de duas civilizações. Exerceu uma posição elevada no governo. Em 1548, acusado de conspiração contra o Vice Rei, foi torturado e executado. Malinche também teve uma filha, D. Maria, com seu marido espanhol. Como mãe de dois filhos mestiços Marina poderia ser considerada a mãe da nação mexicana, a Eva americana.
Seu nome no México moderno é um insulto. Para os mexicanos ser chamado de malinchista é ser chamado de amante dos estrangeiros, um traidor.
Ela não escolhera seu nome nem seu destino.