MATA HARI



Margaretha escolheu com esmero a roupa e os acessórios para aquele dia, vestiu-se calmamente, um belo corselete rendado que afinavam mais ainda sua cintura delicada e deixava mais belos seus seios pequenos, contrastando com sua pele escura. Uma saia comprida e justa realçava seus 1,70 de altura, escolheu um charmoso par de botas, chapéu que cobria parte de seu cabelo negro e luvas.... Calçou-as dedo a dedo com carinho, iam até os cotovelos. Olhou-se demoradamente no espelho, seus lábios e olhos tinham aquele ar de sensualidade que atraem os olhares de homens e mulheres. Uma dama elegante... Uma “femme fatale”. Passou demoradamente o batom nos lábios e colocou duas gotas de perfume. Um rosto lhe veio à mente e suas faces afoguearam-se: Vladimir, mas ela afastou essa tênue lembrança. Estava pronta.
Maragaretha tinha 41 anos e preparava-se para ser fuzilada.
Era uma manhã outonal em Paris do dia 15 de outubro de 1917. O mundo digladiava-se numa guerra que não era dela e que agora não tinha a menor importância.
Nascera no norte da Holanda em 1876. Gostava de esbanjar, herdara a personalidade pretensiosa e ambiciosa do pai holandês, da mãe javanesa o aspecto exótico e a pele escura. A infância foi crítica com a falência dos negócios da família, separação dos pais e morte prematura da mãe. Queria ser professora de escola maternal, mas aos 19 anos, casou-se com um capitão holandês 20 anos mais velho. Com ele contraira sífilis. Em maio de 1897, com seu primeiro filho, Norman, mudou-se para a Indonésia, pois seu marido trabalhava na Companhia das Índias Orientais. Perto de Bali, nasceu Juana-Luisa. Na Ásia como passatempo começou a vestir trajes malaios e a imitar danças locais para oficiais, o que provocava a ira das esposas dos funcionários holandeses. A amante de seu marido era também babá das crianças e tentou matá-los, colocando veneno no molho do arroz. Non sobreviveu, mas Norman não. Em 1902, a família voltou para a Europa e eles se separam. Contra a decisão judicial, o capitão John se recusou a pagar pensão alimentar e seqüestrou Non da mãe, que tinha sua guarda. Em 1903, aos 27 anos ela desembarcou em Paris. Trabalhava como modelo posando nua, tempos depois voltou à Holanda e arrumou um amante, um barão. No ano seguinte voltou para Paris e hospedou-se num bom hotel mandando a conta para o amante.
Nascia Mata Hari, expressão malaia que significa “olho da manhã”, mas pode também ser traduzida por “luz do dia”. Eximia bailarina, se apresentou nas melhores casas de espetáculo, shows belíssimos de strip-tease que encantavam multidões; colecionava amantes e admiradores. De 1910 a 1911 foi viver como amante permanente do banqueiro francês. Fora dos palcos, sem dinheiro, partiu para Berlim atrás de um ex-amante. Porém em 28 de julho de 1914, um mês após o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, o Império Áustro-Húngaro invadiu a Sérvia. O conflito generalizou-se rapidamente: de um lado a Tríplice Aliança (Alemanha, Itália e Áustria-Hungria), de outro, a Tríplice Entente (Inglaterra, França e Rússia). Mata Hari queria voltar para Paris, embarcou no trem para a Suíça. Na fronteira, fizeram-na descer para interrogatório. As autoridades alemãs exigiam um documento oficial atestando sua nacionalidade holandesa e um visto suíço, o que a fez volta para a Holanda. A movimentação daquela mulher desprendida e solteira começou a levantar suspeita junto às autoridades inglesas e francesas. Passou a ser seguida pelo serviço secreto inglês, que procurava indícios para culpá-la de espionagem a serviço da Alemanha. Em Paris era seguida por policiais franceses, alertados pelos ingleses. Para visitar o amado, Vladimir, que fora ferido, Mata Hari precisava de uma autorização especial de acesso à zona militar. Conseguiu autorização, mas trabalharia como espiã para a França.
Em 1917 foi presa pelos franceses, supostamente trabalhava como a espiã H-21 no Serviço Secreto alemão, divulgando muitos dos mais importantes segredos militares franceses, que lhe eram contados pelos seus amantes militares, também teria trabalhado para o Governo francês como contra-espiã. Num julgamento que durou dois dias, foi condenada à morte por traição e como co-autora da morte de mais de 10.000 soldados, devido às informações que passara ao inimigo.
Seu cadáver não teria túmulo, seria usado por estudantes de medicina como era de praxe naqueles tempos, em aulas de anatomia e a cabeça seria mumificada. Mas isso não importava agora. Um pelotão de fuzilamento no castelo de Vincennes a esperava. Enquanto caminhava pensava que sempre fora uma mulher sedutora e não perderia essa última chance, planejava expor os seios, não queria usar a venda e nem ser amarrada, queria o olhar daqueles homens, queria ver sua reação. Imaginava que no último instante algum de seus muitos amantes numa manobra arrojada trocaria os projéteis mortais por balas de festim. Soprou um beijo em direção a eles. Uma só detonação para os 12 tiros, seguida de outra. As trombetas soaram. Seu olhar enigmático perde-se no vazio. Na boca o gosto de um champanhe